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Secretário de Administração do Piauí comenta os desafios da gestão no atual momento de crise

Francisco José Alves da Silva, conhecido como Franzé, nasceu em Buriti dos Lopes-PI. Filho do lavrador Manoel Damião e da lavadeira de roupas Joana Alves, o atual secretário de Administração e Previdência do Piauí é graduado em Ciências Contábeis pela Universidade Federal do Piauí - UFPI, militou no movimento estudantil e é concursado no cargo de Auditor Fiscal da Receita do Município de Teresina. Franzé exerceu funções nas secretarias de Estado da Educação e Fazenda e tem desenvolvido um trabalho econômico que colocou o Piauí em evidência no cenário nacional.

Enquanto estados ricos como Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul atravessam uma grave crise financeira que está comprometendo serviços e pagamentos de servidores públicos, o Piauí se destaca por ser um dos únicos estados do país a manter a folha de pagamento do seu funcionalismo em dia.

Nesta entrevista, o secretário fala sobre como vem conseguindo manter o tênue equilíbrio financeiro das contas públicas, dos desafios da gestão da previdência estadual e ainda sobre as perspectivas econômicas do Piauí e do Brasil a partir de 2017 – que traz indicativos de continuidade da crise. Confira. 

Qual era a situação econômica do Estado no início do atual governo?

Logo na transição de governos, o grupo criado para essa fase fez um levantamento de despesas e de compromissos que o estado possuía, assim como o quantitativo de obras paradas e os motivos da paralisação, buscando identificar quais eram os gargalos. Essa equipe mostrou ao governador um diagnóstico prévio e em cima disso ele começou a dialogar com equipe de secretariado. Isso fez com que trabalhássemos de forma planejada soluções que viessem a dar um equilíbrio financeiro para o Estado. Encontramos em dezembro de 2014 uma situação de quase calamidade: obras paradas, situação de escolas encerrando o ano letivo sem cumprir a carga horária por falta de merenda, material didático e estímulo aos professores; situação de hospitais com UTI’s fechadas, desabastecimento de medicamentos, ambulâncias que não tinham combustível pra fazer o transporte de pacientes, segurança pública sem combustível para os veículos, falta de armamentos e equipamentos de segurança... era uma situação na qual foi preciso ser decretada emergência administrativa em todas as áreas.

Como o Piauí tem conseguido equilibrar as contas diante do quadro de grave crise econômica enfrentada em todo o país?

Foi necessário que nós montássemos um plano de trabalho que focasse em regularizar a situação jurídica de recursos que estavam travados, a situação de gastos com pessoal que estava acima do limite máximo permitido pela Lei de Responsabilidade Fiscal, e também em criar uma organização no campo das receitas. O governador tinha esta preocupação e passou para a equipe econômica a necessidade de medidas efetivas, sob o risco de não ter o caminho de volta, colocando o Piauí em um quadro bastante complicado. E a responsabilidade de um gestor é de ter que dar resposta a 3 milhões de piauienses. Um ato que se faz em uma secretaria como esta repercute na vida , no dia a dia das pessoas. Então começamos a trabalhar a questão da redução dos gastos desnecessários, despesas com pessoal, mantendo a preocupação com o custo da máquina pública. Se fala muito disso na iniciativa privada, mas no setor público isso também existe. Temos um custo. Qual é o custo operacional da saúde pública? Quantos servidores? Qual é o consumo de energia? Quanto podemos cortar para reduzir esse consumo? No setor público, nós também temos que aplicar medidas de gestão financeira que se utilizam na gestão privada e até mesmo na gestão familiar. As pessoas precisam entender que aquela máxima antiga de que “o público é de todo mundo” significa que é exatamente por isso que precisa ser eficiente. 

Quais foram as medidas mais significativas para este resultado? 

Desde janeiro de 2015, trabalhamos nos ajustes de despesas com pessoas, ajustes de custeio no incremento de receita e a partir daí foram várias ações: fizemos o Programa de Recuperação de Crédito Tributário (Refis 2016), CPF na nota, recriamos a Loteria Estadual. Então criamos duas áreas de atuação: gestão eficiente da despesa e incremento de receitas. Foi isso que salvou o Piauí da situação que outros estados estão atravessando, de grandes dificuldades, a ponto do Rio Janeiro, que é um estado rico, hoje estar em situação de calamidade, com salários atrasados em quase quatro meses, com hospitais e escolas paradas, com servidores em greve, penalizando toda a população. O Piauí ficou de fora dessa realidade porque foi feito um trabalho coletivo de ajustes. E a condução do governador nesse sentido fez com que o Piauí se tornasse uma referência nacional. Mostrou que em uma situação de crise, o Piauí tem sido inovador e vanguardista em algumas áreas. 

De onde vem essa tendência de trazer para a gestão pública a forma privada de administrar recursos? 

Vem do nosso governador Wellington Dias, ex-bancário. Eu também era contador antes de ser auditor fiscal, temos uma pessoa do porte do Antônio Neto na Secretaria de Planejamento, que tem toda uma vida na área de fiscalização; Rafael Fonteles, que também vem da iniciativa privada e está gerindo a Secretaria de Fazenda. Montamos uma equipe econômica que agrega a linha pensamento do governador, que sempre foca na questão de desenvolvimento. Então essa junção de pensamentos faz com que trabalhemos a eficiência nos gastos, melhoria de receita, aprimoramento dos métodos de gestão. É a forma de eficiência e resultados. O governo tem trabalhado para que, assim como a iniciativa privada faz, possamos melhorar a remuneração a partir de produtividade. Por exemplo: uma escola vai ter um repasse maior se ela atingir as metas do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) que o governo quer alcançar. A área de segurança vai ter uma melhoria salarial a partir da redução da criminalidade e da sensação de segurança que a população possa ter. A área da saúde, a partir do aumento da qualidade de vida e redução da mortalidade infantil. Então, são várias coisas sendo estudadas para que a gestão pública possa começar a trabalhar essa possibilidade real de remuneração sobre resultados pra que a gente possa ter eficiência e a resposta positiva da população.

A previdência está vivendo um momento de crise em todo o mundo. Como o Estado está lidando com esse problema? 

A previdência é um problema mundial. Portugal, Espanha e Grécia quebraram. A lógica da previdência atualmente é de pessoas que financiam outras pessoas para que elas sobrevivam ao final de sua produtividade. No nosso Piauí, os cálculos atuariais trabalhavam com uma estrutura de longevidade menor. As pessoas contribuiriam por 30 anos e seriam financiadas por 15 ou 20. Com a evolução da medicina, a longevidade aumentou e o sistema não aguenta. Temos menos pessoas financiando e mais pessoas recebendo, por um tempo maior. Esse é o grande gargalo. No Piauí é assim também e o desafio é capitalizar o fundo para que ele possa manter essas pessoas e não seja preciso retirar recursos das outras políticas públicas. A ideia dos feirões, a partir das articulações com bancos e empresários, é de movimentar a economia nesse cenário de crise. Fizemos nesse ano duas grandes movimentações: uma foi imobiliária, com a venda de apartamentos e casas, e outra na área de automóveis. Chamamos a atenção do Brasil. Aumentamos a arrecadação e parte do que foi vendido foi para o fundo de previdência. Nossa preocupação é de trazer dinheiro novo para previdência, que não venha mais apenas das contribuições.

O que o senhor pensa a respeito da aprovação da PEC 241, que pretende congelar os gastos públicos por 20 anos?

Tecnicamente eu sou favorável à questão dos ajustes. Tanto que fizemos isso aqui. É preciso fazer ajustes na máquina pública. Mas todos os ajustes são decorrentes da realidade. A economia que eu posso fazer no meu orçamento familiar talvez não seja a mesma que você precisa fazer. Posso cortar despesas e fazer meu equilíbrio cortando a cerveja do fim de semana, mas se eu for sugerir para você, não vai ser da mesma forma, pois você não bebe. Foi feita uma receita que tem que servir a todos da mesma forma. Eu acredito que deveria ter sido feito pelo governo federal um indicador de redução, mas não uma receita pronta, como propõe a PEC. Ela prevê que a União, Estados e Municípios façam coisas que para uns pode ser necessário e para outros, não. Então, onde não for necessário cortar, vai prejudicar a qualidade das políticas públicas em detrimento de outros aspectos que estão realmente desorganizados e precisam de cortes. Essa é uma das críticas: quem fez as coisas corretas vai ser penalizado. E outra crítica é que a PEC só prevê redução e não contempla crescimento. O que existe na PEC sobre medidas para União, Estados e Municípios fazerem com que novos empregos sejam gerados? Para que sejam atraídos investimentos internacionais? Não tem. Só se preocuparam com uma parte do problema. O Brasil está estagnado no crescimento e na PEC não foi apontado nada para esse sentido. No Piauí nós fizemos isso. Cortamos despesas, mas nos preocupamos em trazer empregos, empresas, fazer o Piauí. Não dá para se fazer o equilíbrio só com metade da laranja.

Quais são os planos do governo para gerar mais eficiência no seu funcionalismo?

Modernizar a máquina administrativa, viabilizando a realização de serviços on-line. Hoje, nós declaramos nosso Imposto de Renda através da internet, por isso é inconcebível que seja necessário ir até uma delegacia para se fazer um Boletim de Ocorrência, por exemplo. Por isso, nossa meta é investir em tecnologia e autoatendimento e depois disso, renovar o pessoal, estabelecendo um perfil de seleção que traga a eficiência da máquina, através de concurso público.

Quais são os desafios econômicos para 2017?

Antes de tudo é manter esse equilíbrio tênue. Infelizmente, a crise que vivemos hoje possui todos os indicativos de que continuará em 2017. Não vejo nenhuma sinalização no sentido de que o país retomará o crescimento econômico. Por isso, o que vamos fazer aqui é estabelecer metas internas de crescimento. E aí partimos para a articulação com o setor privado. O Estado está tentando desburocratizar e viabilizar uma prática que não existia na nossa cultura, que são as Parcerias Público Privadas (PPP’s). O Estado não tem condições de fazer uma rede de esgotamento sanitário que atinja a universalização, por exemplo. Precisamos dar resposta à sociedade, para isto e as PPP’s são um caminho. Vamos trabalhar isso em todos os setores possíveis, discutindo com servidores e sociedade para encontrar uma saída. Já que não há perspectiva de crescimento com receita própria, temos que tomar esse caminho.

A.N.

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