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Inglaterra se une à guerra contra os refrigerantes

O governo do Reino Unido surpreendeu o mercado ontem ao anunciar um imposto sobre bebidas açucaradas, abrindo um novo campo de batalha entre a indústria mundial de refrigerantes e os formuladores de políticas públicas que buscam reduzir o consumo de açúcar. George Osborne, o titular das Finanças do Reino Unido, anunciou o novo imposto sobre a venda de refrigerantes ao apresentar o orçamento de 2016. Ele estimou que a medida resultará na arrecadação de 520 milhões de libras esterlinas (US$ 735,8 milhões) no primeiro ano, com receitas menores nos anos seguintes, à medida que os fabricantes reduzam o uso de açúcar. O escritório de Responsabilidade Orçamentária do Reino Unido calculou que, com base na meta de receita do governo, o imposto sobre bebidas açucaradas resultaria em uma cobrança de 18 centavos de libra por unidade ou 24 centavos por litro, o que “esperamos que seja repassado inteiramente ao preço pago pelos consumidores”.

Grupos que representam o setor criticaram a medida.

“Estamos extremamente decepcionados com o anúncio de hoje”, disse Ian Wright, diretor-geral da Federação de Alimentos e Bebidas, entidade que representa o setor no Reino Unido. “A criação desse imposto, infelizmente, vai resultar em menos inovação e reformulação de produtos e, para alguns fabricantes, ela certamente custará empregos.”

O governo britânico havia informado anteriormente que não tinha planos para introduzir um imposto sobre as bebidas açucaradas. Em janeiro, o primeiro-ministro David Cameron expressou relutância em considerar o imposto, embora tenha observado a necessidade de ações para combater a obesidade. O governo havia defendido um foco em outras medidas, como o aumento da conscientização sobre os perigos de consumir muito açúcar e uma melhor rotulagem dos alimentos.

O anúncio de Osborne reflete uma mudança radical. “Não estou preparado para olhar para trás, na minha passagem por este Parlamento e [...] ter de dizer para a geração dos meus filhos: ‘Sinto muito, sabíamos que havia um problema com as bebidas açucaradas, sabíamos que causavam doenças, mas nos esquivamos das decisões difíceis e não fizemos nada”, disse ele.

O imposto será introduzido em dois anos para dar tempo às empresas para que mudem o leque de produtos. Osborne disse que os sucos puros de frutas e bebidas à base de leite seriam excluídos da medida. O governo britânico planeja consultar a indústria sobre a aplicação do imposto.

As ações da Coca-Cola Co. e da PepsiCo Inc. recuaram ontem 0,4% e 0,3%%, respectivamente, na Bolsa de Nova York. A cotação da ação da Britvic PLC — distribuidora das bebidas da Pepsi no Reino Unido e Irlanda e que tem suas próprias marcas de refrigerantes — caiu 1,3% em Londres.

“Nossas iniciativas estão fazendo mais para reduzir a ingestão de açúcar e calorias do que um imposto conseguiria”, disse Jon Woods, gerente geral da Coca-Cola na Grã-Bretanha. “Essa taxa vai contra evidências em todo o mundo de que os impostos fazem muito pouco, se é que fazem algo, para reduzir os níveis de açúcar, a ingestão de calorias ou a obesidade, mas elevam o custo de vida das pessoas.”

Embora o Reino Unido seja um mercado relativamente pequeno para os fabricantes mundiais de bebidas, os executivos vinham se preocupando com o precedente que a adoção de um imposto pelos britânicos criaria.

França, México e Chile já adotaram um imposto similar. Índia, Indonésia, Filipinas e África do Sul também estudam a medida. Nos Estados Unidos, vários Estados e municípios também vêm debatendo a ideia. No Brasil, um imposto ainda não foi debatido, mas uma lei que proíbe a venda de refrigerantes nas escolas entrou em vigor no ano passado.

Uma comissão da Organização Mundial de Saúde recomendou em janeiro que os governos considerem impostos especiais sobre bebidas açucaradas, seguindo o exemplo do México. Ela recomendou no ano passado que adultos e crianças mantenham o consumo de açúcares adicionados abaixo de 10% do total de calorias consumidas diariamente — o equivalente a pouco mais do que uma lata de 350 ml de refrigerante.

“Há países que estão despertando para a gravidade desse problema e começam a fazer algo”, diz Kelly Henning, líder de programas de saúde pública da Bloomberg Philanthropies, organização filantrópica do empresário e político Michael Bloomberg que defendeu o imposto aos refrigerantes do México, mas não atuou no Reino Unido.

A indústria de bebidas afirma que é injusto criar impostos especiais apenas para as bebidas açucaradas e já investiu mais de US$ 100 milhões desde 2009, só nos EUA, em lobby para derrotar propostas semelhantes em mais de 20 cidades e Estados.

Mas a tendência a favor da regulamentação é clara e vem se acelerando. Os legisladores do Estado de New York, por exemplo, estão propondo rótulos de advertência de riscos à saúde; na Califórnia, os legisladores propuseram um imposto especial sobre bebidas açucaradas. Ao todo, 39 Estados e cidades americanas têm impostos sobre bebidas açucaradas, embora, em geral, eles sejam baixos demais para afetar o consumo, segundo o Centro para a Ciência de Interesse Público, um grupo de saúde pública que critica a indústria de refrigerantes.

Ainda assim, as vendas de refrigerantes nos EUA caíram durante dez anos consecutivos em termos de volume, à medida que os americanos passam a preferir alternativas como água engarrafada, de acordo com a firma de pesquisa Beverage Digest

O imposto do México, de cerca de 10% sobre o refrigerante, criado em 2014, ajudou a reduzir o consumo dessas bebidas no país, de acordo com um estudo publicado este ano no “BMJ”, publicação médica do Reino Unido. A medida reduziu em 6% as vendas anuais ao longo dos últimos dois anos, segundo o estudo. As vendas de refrigerantes no Reino Unido somaram US$ 4,64 bilhões em 2015, ou 2,8% das vendas globais. A Coca-Cola, líder da indústria de refrigerantes, tinha 59% do mercado britânico, à frente da PepsiCo, com 16%, segundo a provedora de dados Euromonitor International.

Fonte: WSJ
Enviada por JC

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