post image

Beber em demasia pode afetar cérebro de jovens, diz estudo

A exposição exagerada ao álcool durante a adolescência e a juventude pode prejudicar o desenvolvimento do cérebro, em área relacionada ao aprendizado e à memória, segundo pesquisadores do Duke University Medical Center. O estudo, publicado ontem na revista “Alcoholism: Clinical & Experimental Research”, fornece novas pistas de como a exposição ao álcool durante esse período, quando o cérebro não está totalmente desenvolvido, pode resultar em anormalidades sinápticas e no nível celular, causando efeitos prejudiciais duradouros sobre o comportamento.

— Aos olhos da lei, pessoas com 18 anos são consideradas adultas. Mas o cérebro continua a amadurecer até os 20 e poucos anos — analisa a autora do estudo, Mary-Louise Risher, pesquisadora do Departamento de Psiquiatria e Ciências Comportamentais da Universidade de Duke, nos Estados Unidos. — É importante que os jovens saibam que, quando bebem muito durante esse período de desenvolvimento cerebral, podem causar impacto duradouro sobre a memória e outras funções cognitivas.

De acordo com Ilana Pinsky, psicóloga e professora do Departamento de Psiquiatria da Universidade Federal de São Paulo e fundadora do ambulatório de adolescentes da Uniad (Unidade de Pesquisa em Álcool e Drogas), o cérebro se forma até os 25 anos, mais ou menos, e a área da impulsividade é uma das últimas a se desenvolver. Por isso, segundo ela, é comum ver jovens adultos e adolescentes impulsivos, com “mente aberta, menos temerosos”.

— Eles enxergam o perigo de forma diversa do adulto, porque processam a informação de modo diferente. E esse novo estudo mostra que, com o álcool, há possibilidade de danos permanentes na formação do cérebro, no nível celular. Há possibilidade de estagnação de parte do desenvolvimento de memória e de aprendizado. Como se a pessoa continuasse a ser um eterno adolescente, um ser que dificilmente aprende — opina Ilana, que explica que o aprendizado está diretamente ligado à memória. — Não se coloca a mão numa chapa quente duas vezes porque se aprende que aquilo machuca.

Estudo recente da Universidade de São Paulo com estudantes de escolas públicas de Uberlândia mostrou que 94,3% deles têm o primeiro contato com o álcool aos 13 anos. E que meninos têm 2,2 vezes mais chances de cometer exageros relacionados ao consumo desse tipo de bebida, se comparados às meninas.

Evelyn Eisenstein, professora associada de pediatria e clínica de adolescentes da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj), conta que os casos de adolescentes, jovens e adultos com problemas associados à gestão excessiva de álcool que chegam às emergências dos hospitais aumentam de 15% a 20% nos fins de semana. Ela cita complicações como desidratação, coma alcoólica, overdose e até acidentes de trânsito influenciados pelo abuso do álcool.

— O jovem, por estar em fase de desenvolvimento cerebral, pode ser mais sensível a pequenas quantidades de álcool. E isso afeta o órgão. Até porque o jovem ainda não aprendeu a beber. E, a longo prazo, pode ter outras doenças associadas ao alcoolismo, como a cirrose.

Hiperatividade e inteligência maior

Mary-Louise, o pesquisador Scott Swartzwelder e seus colegas expuseram, periodicamente, jovens camundongos a um nível de álcool que em humanos seria prejudicial. Depois, as cobaias não receberam mais qualquer quantidade de álcool até a idade adulta, que, nesse caso, gira em torno de 24 a 29 dias.

Estudos anteriores feitos por equipes da mesma universidade mostraram que as cobaias jovens expostas ao álcool se tornaram adultas menos hábeis em tarefas de memória. E para tentar entender como essas dificuldades se manifestavam no nível celular, no hipocampo, onde a memória e o aprendizado são controlados, eles usaram pequenos estímulos elétricos no local e mediram a potencialização de longa duração, que é o fortalecimento das sinapses cerebrais, e como elas são usadas para aprender novas tarefas e recuperar memórias.

O aprendizado ocorre de forma mais eficiente quando essa atividade é robusta o suficiente para construir fortes transmissões de sinais entre os neurônios. E o aprendizado é crucial para que os adolescentes adquiram grande quantidade de novas memórias na transição para a vida adulta.

Os pesquisadores esperavam encontrar anormalidade nas cobaias adultas que foram expostas ao álcool. Mas ficaram surpresos com as transmissões hiperativas nelas, em comparação com os animais que não haviam sido expostos à bebida.

— Poderíamos pensar que os animais seriam mais inteligentes por causa das transmissões hiperativas. Mas ocorre o oposto. Se houver muitas transmissões num desses circuitos, é possível que em um outro período não se produzam mais. O circuito fica saturado, e o animal para de aprender. O cérebro precisa de um delicado equilíbrio entre a excitação e a inibição para trabalhar de forma otimizada — explicou Swartzwelder.

A equipe ressaltou que essa anormalidade foi acompanhada por uma mudança estrutural em células nervosas individuais. As pequenas saliências dos ramos das células, chamadas espinhas dendríticas, tinham aparência magra e comprida, sugerindo imaturidade. Segundo Risher, essa imaturidade das células cerebrais pode estar associada à imaturidade comportamental.

Fonte: O Globo

Compartilhar

Permito o uso de cookies para: